sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Sim, é um cachimbo!

A palavra "cachimbo" é intrigante. Uma das várias hipóteses para sua origem remete ao guarani caatimbó — fumaça (timbó) que vem de erva (caá) queimada.

Dizem alguns estudiosos, no entanto, que devemos pensar em ka jingu, de origem africana. Nas línguas da família banta, este ka é um prefixo diminutivo, e jingu uma espécie de cachimbo.

Ou ainda, como afirma Nei Lopes, no Novo dicionário banto do Brasil, terá suas raízes no quimbundo kuxiba, "chupar".

"Cachimbo" desconcerta os etimólogos porque o mesmo aparelho para fumar, em outros idiomas, soa diferente. Em francês, é pipe. Em espanhol, pipa. Em finlandês, piippu. Em inglês, pipe. Em italiano, pipa. Em alemão, Pfeife. Em holandês, pijp. Em irlandês, píopa. E todos procedem de *pipa, do latim vulgar, em conexão com o verbo latino pipare, "chiar". A alusão ao chiado tem a ver com o ruído que se faz nas cachimbadas.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

A etimologia que entrou em parafuso

A etimologia não é uma ciência exata, e por vezes os caçadores de palavras entram em parafuso! A palavra "parafuso", por exemplo, não tem uma história muito clara, o que não impede especulações e hipóteses em torno de objeto tão importante para a construção de uma sociedade!

O linguista Rosário F. Mansur Guérios se refere à expressão latina medieval *pare fusu, "fuso parelho", assemelhado ao fuso de fiar.

Outra possibilidade, de difícil confirmação, é que, proveniente do espanhol parahuso, o termo nesse idioma tenha nascido da tradução/adaptação da palavra alemã Bohreisen, formada por bohren, "furar", e eisen, "ferro". O pequeno ferro que fura. Uma hipótese que não é fácil atarraxar!



No século XIX, surgiu a expressão "ter um parafuso a menos (na cabeça)", indicando que alguém, por apresentar comportamento estranho e inconveniente, estaria com doença mental grave, ou simplesmente desorientado. Certamente uma comparação entre máquinas que não funcionam bem e seres humanos atrapalhados.

Entra em parafuso quem se sente perdido, naquela arriscada manobra em que o avião perde altura e desce, rodopiando, como se fosse esborrachar-se no solo.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Eis um bando de bandidos!

Já li em alguns textos a expressão "bando de bandidos". Temos aqui uma redundância? O que os bandidos têm a ver com "bando"? Todo bando é formado por bandidos, ao menos do ponto de vista etimológico?

Os godos no início da era cristã designavam com a palavra *bandwa o emblema que identificasse um grupo, a bandeira, o estandarte, a insígnia. Em típica inversão, o termo acabou por designar o próprio grupo, a própria facção representada. A palavra é assumida pelo latim medieval bandum. No provençal, banda era "corpo de tropa", "partido", "lado".

A palavra "bando" pode referir-se a um ajuntamento de pessoas pura e simplesmente. Ou de animais. Ou a um bando de criminosos e de bandidos.

"Bandido" remete ao italiano antigo bandetto, aquele que foi banido da sociedade, em consonância com o verbo bandire, "banir", "exilar", "proscrever". Este verbo está unido ao verbo gótico (sim, voltamos ao gótico!) *bandwjan, "assinalar".

O bandido é expulso, mas para isso tem de ser assinalado; que todos vejam como o bandalheiro deve ser excluído da comunidade.

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

O que faz alguma coisa ser fascinante?

Um leitor do blog pergunta de onde vem a palavra "fascinante".

Voltemo-nos para o latim fascinantis. Quem está experimentando um fascínio sente-se fortemente atraído por uma visão. Está enfeitiçado, seduzido por palavras encantatórias.

Uma pessoa fascinante deixa seus admiradores em estado de espanto. Ficar embasbacado é sofrer a ação do que fascina. Extasiados perante o que fascina, abrimos a boca e perdemos a fala.
No latim também havia fascinus, amuleto com poderes mágicos. Uma forma de manter o outro sob o domínio da magia é paralisá-lo. O amuleto também "congela" aqueles que pretendem fazer o mal.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Todo exame é exigente

Todo exame é exigente. Tanto o exame de sangue como o Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) pedem que a pessoa dê um pouco do próprio sangue.

A palavra "exame" está vinculada ao latim exigere, vocábulo composto de ex mais agere. A exigência do exame, portanto, é uma ação que, vinda de fora e/ou de dentro, nos obriga a superar-nos, a sair de nós mesmos, a dar o melhor de nós.

Há vários significados para os dois verbos examinare e exigere — "exigir", "examinar", "analisar", "fazer cumprir", "medir", "apreciar", "julgar" e até... "torturar".

O sentido de exame como teste especificamente voltado para aferir o grau de conhecimento de uma pessoa começa a se impor a partir do século XVII.

domingo, 7 de novembro de 2010

Famosos pra cachorro!

Muitos animais fizeram sucesso no cinema e na TV. Os cachorros estão entre os atores mais famosos, como Lassie,  Rin Tin Tin, Beethoven e, mais recentemente, Marley.


No latim vulgar supõe-se que havia a forma *cattulus, da qual teria vindo o nosso "cachorro". Antes, no latim clássico, catulus significava, genericamente, o filhote de um animal. Com o tempo, associou-se ao filhote do cão e ao próprio cão, dentre todos os quadrúpedes o companheiro mais próximo do ser humano.

O cachorro seria, então, o filhote por excelência, e, por uma dessas peças que o pensamento confundente nos prega, a cria e o filhote do próprio ser humano!

sábado, 6 de novembro de 2010

Para lá de caxangá

Um leitor deste blog perguntou pela origem de "caxangá", possivelmente lembrando a canção Escravos de Jó. Ou talvez a música Caxangá de autoria de Milton Nascimento e Fernando Brant, que Elis Regina interpretava brilhantemente.


A palavra "caxangá" possui vários significados.

Pode ser o gorro branco dos marinheiros, em tecido de algodão, as abas para cima. Ou um crustáceo, um tipo de siri, o Callinectes larvatus. Ou adereço usado pelas mulheres do estado de Alagoas.

Existem inclusive registros na música brasileira sobre um certo repentista mineiro que se chamava Caxangá.

A verdade é que não se sabe por que gorro, siri, adereço e cantor receberam esse nome. Não há como associá-los a alguma história etimológica.

O etimólogo José Pedro Machado limita-se a dizer que a palavra vem do tupi caá-çangá, indicando como fonte o Dicionário Tupi-Guarani-Português, de Francisco da Silveira Bueno. A palavra significava "mata extensa".

No Dicionário de Palavras Brasileiras de Origem Indígena, de Clóvis Chiaradia, extensa é a lista das acepções: siripuã, gorro de marinheiro, adereços para mulheres, brinquedo infantil cantado, vila de um município no Espírito Santo, um bairro de Recife, um povoado no Pará, nome de um igarapé no Amazonas, um córrego em Macaé (RJ), uma localidade em Sergipe, outra em Pernambuco...

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

De presidente para presidenta

Decisões políticas estão unidas a decisões linguísticas. Se a recém-eleita presidenta Dilma Rousseff quiser enfatizar que pela primeira vez uma mulher foi escolhida para esta função no Brasil, preferirá o substantivo feminino em lugar do artigo apenas, "a presidente".

A palavra remete ao latim praesidere, "estar em primeiro lugar", "governar", "administrar". Mais literalmente, significava sentar-se (sedere) diante (prae) de outras pessoas, para dirigir-lhes a palavra em situação de destaque e liderança.

A partir do século XVIII, em inglês (president) e em outros idiomas, assumiu o sentido de principal líder numa república.